sábado, outubro 13

Mindinhos

Todos os dias, sem intervalo, os dedos mindinhos sangravam. Era o preço que pagava por ter mindinhos tímidos. É, isso mesmo! Tímidos! Suas cabeças são para baixo e sempre entravam em atrito com o carpete. Hoje em dia só ando de chinelos em casa e é tudo azulejado, pois também atacava meu nariz. E, além disso, as únicas coisas que o machucam são sapatilhas em dias de chuva e raros saltinhos, só que esses também pegam atrás, aí viram bolhas quentes e dolorosas, mas enfim, só machucavam porque eu era feliz. Ai...éééé, não torce o nariz! É que eles entravam em atrito de tanto eu dançar em frente ao espelho que tinha no corredor da casa velha. Uma de quando eu era pequena, eu amava machucar meus dedos naquele carpete marrom. Que saudade. Apesar de tudo, lembrando agora, aquela casa tem muita história, muita mesmo. A gente mudou pra lá de verdade depois que a outra parte da família saiu, acho que eu tinha uns oito ou nove anos.
Tinha dois quartos, um dentro do outro, um banheiro gigantesco, dava até para brincar de pega – pega, a sala, a cozinha, com azulejos verdes com preto (hahaha, eram horríveis!), o corredor em frente ao banheiro, bem pequeno, com um espelho grande, que a gente tem até hoje, a lavanderia, um quartinho de bagunça, que eu não entrava nem por decreto, o quintal todo de cimento, também gigantesco, o portão azul e o jardim cheio de mato, só com um pé de cana e um de romã. E mesmo assim, eu acho que eu nunca comi romã...não lembro.
Na verdade, lembrei da casa muito por acaso. O que sinto falta mesmo é dos meus dedinhos machucados. Minha mãe ia dormir e eu continuava dançando, até eu deitar no sofá, pegar no sono e ir para cama. E isso toooodos os dias. Só sentia as consequências nas manhãs corridas e chatas dos meus dias.
Depois, eu dançava na sala, depois na sala do apartamento....até que aos poucos eu fui perdendo o ar e o meu tempo com responsabilidades. Mas é bom lembrar...só não gosto muito de ver meus mindinhos sem sangrar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário